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Acesso em 21/12/2024 às 16h14.

Vinho contra as doenças do coração

Vinho contra as doenças do coração

Imagem de vivash no Freepik

 

Estudos comprovam que as doenças coronarianas ocorrem em menor proporção nos países onde se consome vinho de forma regular e moderada. A relação entre vinho e coração só começou a assumir importância após a investigação do chamado “paradoxo francês”. A população da França tem o hábito de tomar vinho e o país é reconhecido pela qualidade da bebida lá produzida. O que nem todo mundo sabe é que os franceses se alimentam de comida gordurosa (principal fator de risco dos enfartes), têm pressão arterial alta, níveis elevados de colesterol no sangue e hábito de fumar, como em outros países europeus. No entanto, o número de mortes por doenças coronarianas na França é relativamente baixo, o que muitos pesquisadores consideram um fenômeno aparentemente contraditório. Essa contradição, ou paradoxo francês, é conhecida desde 1987.
 

Os cientistas, ao buscarem respostas para o paradoxo, têm atribuído ao vinho os baixos índices de mortalidade. Os franceses tomam, em média, 180 mililitros de vinho por dia, o que dá mais ou menos um copo. Essa quantidade já foi bem maior. Em 1986, por exemplo, o consumo médio era de 305 mililitros por dia.

A partir da descoberta deste paradoxo, mais de 13 mil trabalhos foram publicados na literatura científica mostrando que o vinho tem as mais variadas virtudes terapêuticas. A bebida, particularmente o vinho tinto, é uma importante fonte de flavonóides e de outros polifenóis. Essas substâncias são antioxidantes, impedindo a ação dos chamados “radicais livres”, que se formam em nosso corpo, inibindo a oxidação do colesterol de baixa densidade (LDL), o que reduziria o risco de doenças coronarianas. Os flavonóides e,  de um modo geral, os polifenóis, são solúveis em água e podem inibir os processos metabólicos que conduzem ao ataque cardíaco.

Análises químicas realizadas em vários tipos de vinho revelaram que eles contêm altos níveis de flavonóides e de outras polifenóis. As quantidades dessas substâncias presentes no vinho dependem da matéria-prima (tipo de uva) e das técnicas de fabricação dessa bebida. Os vinhos tintos têm, geralmente, níveis muito mais altos de substâncias fenólicas, como os flavonóides, do que os vinhos brancos. O vinho tinto contém de 1 a 2 gramas dessas substâncias por litro e no vinho branco a massa é bem menor (de 0,2 a 0,3 grama por litro).

Um grupo de pesquisadores franceses determinou as quantidades de flavonóides e de outras substâncias fenólicas presentes em 60 tipos de vinhos produzidos no sul da França. O estudo revelou que as variedades de vinhos tintos que apresentavam maiores quantidades de flavonóides e de outros polifenóis eram os dos tipos Cabernet-Sauvignon (2,6 gramas por litro), Egiodola (2,4 gramas por litro) e Syrah (2,3 gramas por litro). As variedades Merlot e Grenache continham de 1,8 a 2,0 gramas por litro. O vinho Chardonnay (branco) continha apenas 0,25 grama de substâncias fenólicas por litro.

 

Foto: Jill Wellington from Pixabay

 

Existem seis tipos de flavonoides, cada um com características estruturais específicas. Por exemplo, as flavononas ocorrem, predominantemente, nas frutas cítricas como laranja, tangerina e limão; as flavonas existem em ervas, como as usadas em chás; os isoflavonóides são encontrados em legumes; as antocianinas, em frutas; e os flavonóis, em frutas e verduras. Dependendo do modo de preparação e de processamento das frutas e de outros vegetais, o conteúdo de flavonóides pode ser reduzido em até 50%. Se uma pessoa não pode ingerir álcool, o consumo desses alimentos também pode auxiliar na prevenção das doenças cardíacas. Grãos e sementes oleosas também têm flavonóides, que são, em geral, descartados durante a preparação ou processamento desses alimentos. Mel, chocolate, doces e compotas também contêm diferentes tipos de flavonóides. Estas substâncias só não estão presentes em alimentos de origem animal, como as carnes.

Mais especificamente, o efeito cardioprotetor do vinho no corpo humano é atribuído principalmente ao resveratrol, cuja taxa de concentração é elevada em relação a outros bebidas e alimentos. O resveratrol é um flavonóide que promove uma elevação da taxa de colesterol HDL (bom colesterol) por meio do aumento de suas subfrações HDL2, HDL3 e das apolipoproteínas A-1 e A-2 e por uma ação antioxidante, que levaria à diminuição do colesterol LDL (mau colesterol, responsável pelas lesões ateroscleróticas).

Há, ainda, estudos que demonstram que o vinho tinto tem outras propriedades benéficas, além do efeito protetor do coração. Ele pode inibir a formação e o crescimento de tumores e bloquear os mecanismos internos que podem causar aterosclerose, uma doença que leva a uma redução do diâmetro dos vasos sanguíneos, podendo resultar em seu entupimento. Além dessas características, o vinho possui propriedades anti-inflamatórias. Há trabalhos científicos que atribuem essas notáveis propriedades à bebida por ela conter álcool, uma vez que os sucos de uva não apresentam a mesma eficiência que os vinhos na prevenção dos ataques cardíacos e na redução dos processos inflamatórios. Apesar de também conterem álcool, as concentrações de flavonóides na cerveja e no whisky são baixas, o que não lhes confere as mesmas propriedades protetoras do vinho.

O vinho tinto e até o suco e a casca da uva também têm a capacidade de estimular a produção do óxido nítrico (NO). Por sua vez, o NO influi nos mecanismos e na interação com o colágeno, pois esse óxido é um vasodilatador. Veja artigo sobre o NO clicando aqui.

O quadro I apresenta as estruturas básicas de alguns flavonóides. Estão representados o resveratrol, componente mais ativo do vinho, e as estruturas básicas derivadas do resveratrol: antocianinas, flavonas e isoflavonas. A diferença entre as estruturas básicas das flavonas e das  isoflavonas consiste na ausência de um grupo carbonil, de uma dupla ligação no anel heterocíclico, além de uma mudança na posição do anel aromático em relação ao grupo cetona.

 

Antonio Carlos Massabni (amassabni@uol.com.br) e Maurício Cavicchioli (mauriciocavicchioli@gmail.com)
Instituto de Química – Unesp de Araraquara
Publicado em agosto de 2010

 

 

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