Marca do CRQ para impressão
Disponível em <https://crqsp.org.br/meitnerio/>.
Acesso em 20/09/2025 às 20h39.

Elemento Químico – Meitnério

Elemento Químico – Meitnério

19 de setembro de 2025, às 14h54 - Tempo de leitura aproximado: 6 minutos

Meitnério: o elemento raro que homenageia Lise Meitner

 

 

O meitnério é um elemento químico sintético e altamente radioativo que teve poucos átomos produzidos no mundo até o presente. As propriedades físicas e químicas são em grande parte teóricas devido à instabilidade.

Menos de 10 átomos já foram produzidos sinteticamente, e provavelmente nunca serão isolados em quantidades observáveis. Ele é produzido pelo bombardeamento do bismuto com átomos de ferro. O meitnério não tem papel biológico.

O elemento tem símbolo Mt e número atômico 109. Sua densidade, energia de ionização, afinidade eletrônica, eletronegatividade e pontos de fusão e ebulição são desconhecidos.

Pertence ao grupo 9 da Tabela Periódica. Acredita-se que seja sólido à temperatura ambiente e classificado como metal, muito denso e com propriedades semelhantes às de outros metais de transição do mesmo grupo, como o irídio e o ródio. Pode apresentar estados de oxidação variáveis, como +3, +1 e -1.

Existem vários isótopos de meitnério com números de massa entre 266 e 279, com meia vida variando de milissegundos a segundos. O meitnério-266 tem meia-vida de apenas 1,7 milissegundos e o meitnério-276 tem meia-vida de menos de 1 segundo. O isótopo com duração maior é o 278, com meia-vida de 8 segundos. Ele decai como bóhrio-274 por decaimento alfa.

Como apenas uma mínima quantidade de meitnério foi produzida até o momento, o elemento tem aplicação apenas na pesquisa científica, desempenhando papel importante em estudos de síntese de elementos superpesados, na exploração de suas propriedades nucleares, nas teorias e modelos de forças nucleares e estabilidade atômica.

Não foram realizados experimentos químicos com meitnério, pois um isótopo suficientemente estável deste elemento ainda precisa ser desenvolvido.

Previsões teóricas informam que o meitnério-271, que pode ser produzido pela reação de urânio com cloro ou de berquélio com magnésio, pode ter uma meia-vida suficientemente longa para permitir um experimento químico átomo-com-átomo.

Vídeo da Universidade de Nottingham aborda a descoberta do meitnério e como seu nome foi escolhido. Veja abaixo:

 

 

História

 

O acelerador de íons do GSI, em Darmstadt, na Alemanha, onde o meitnério foi sintetizado, em fotografia de 2017. Foto: J. Hosan, GSI/FAIR

 

O meitnério foi produzido pela primeira vez por Peter Armbruster, Gottfried Münzenberg e seu grupo no Gesellschaft für Schwerionenforschung (GSI), Laboratório de Pesquisas de Íons Pesados, em Darmstadt, na então Alemanha Ocidental.

Em 29 de agosto de 1982, os cientistas alemães produziram e identificaram o elemento 109 ao bombardear um alvo de 209Bi com núcleos acelerados de 58Fe em um equipamento denominado de acelerador de partículas. Obtiveram um átomo de meitnério-266, extremamente instável, com meia-vida de cerca de alguns milissegundos, que se desintegrou por decaimento radioativo, liberando partículas alfa e um nêutron livre.

Para produzir o experimento, os cientistas bombardearam o alvo durante uma semana e conseguiram produzir um único núcleo fundido. O grupo confirmou a existência do elemento 109 por quatro medições independentes. O único átomo recém-formado recuou do alvo na velocidade prevista, e foi separado de núcleos menores e mais rápidos por um filtro de velocidade recém-desenvolvido. O tempo de voo até o detector e a energia de impacto foram medidos, e corresponderam aos valores previstos pelo grupo, em torno de 5 milissegundos.

Dois outros átomos foram sintetizados no GSI seis anos depois, em 1988. É importante destacar os grandiosos conhecimentos intelectuais e as prodigiosas conquistas técnicas exigidas para que se chegasse a esses resultados. Além do elemento 109, o grupo de Darmstadt também sintetizou por meio de fusão a frio os elementos 107, bóhrio, e 108, hássio.

O grupo alemão decidiu homenagear a física austríaca Lise Meitner ao dar o nome ao elemento 109. O nome meitnério foi oficialmente adotado apenas em 1997.

 

Quem foi Lise Meitner

 

Otto Hahn e Lise Meitner em Berlim: muitos anos de parceria científica, e Prêmio Nobel de Química só para ele. Wikimedia Commons.

 

O nome do elemento artificial 109 homenageia a física austríaca Lise Meitner, nascida em Viena em 1878. Em condições muito difíceis para uma mulher, e ainda por cima judia, ela conseguiu se formar em física e tirou o equivalente a um PhD em 1907, mudando-se para o Kaiser Willhelm Institute, em Berlim, onde começou a estudar um novo campo de pesquisa, a radioquímica. Em 1926 ela se tornou a primeira mulher na Alemanha a assumir a cátedra do ensino de física na Universidade de Berlim.

Foi lá que ela conheceu o químico Otto Hahn, com quem teve uma longa e produtiva colaboração científica. Nos anos 1930, os dois trabalharam com urânio irradiado com nêutrons, mas antes de completar seus estudos, a ascensão do nazismo forçou Meitner a fugir para Estocolmo, na Suécia.

Meitner e Hahn observaram que o bário era produzido pela irradiação de urânio com nêutrons. Mesmo com Meitner morando em Estocolmo, os dois trocavam cartas sobre o assunto. Em 1938, quando caminhava com o sobrinho Otto Frisch, Meitner finalmente conseguiu entender o que acontecia: os nêutrons estavam causando a divisão dos núcleos de urânio, gerando bário, um elemento com átomos um pouco maiores que a metade do tamanho dos do urânio. Meitner e Frisch previram que o criptônio deveria ser o outro produto dessa reação de fissão, e logo depois Frisch confirmou esta previsão.

Lise Meitner passou a Segunda Guerra Mundial na Suécia, uma época muito difícil para ela, após tomar conhecimento dos ataques com bombas atômicas a Hiroshima e Nagasaki, um final que ela considerava dramático para sua descoberta da fissão nuclear. Além disso, seu companheiro de pesquisas por muitos anos, Otto Hahn, ganhou sozinho o Prêmio Nobel de Química de 1944 sem dividir o prêmio com ela, por conta de restrições do comitê Nobel por Lise ser mulher.

 

Glenn Seaborg (1912-1999) concede o Prêmio Enrico Fermi a Lise Meitner (1878-1968) em 1966, no Laboratório Cavendish, em Cambridge, Inglaterra. Meitner descobriu o elemento protactínio, bem como a fissão nuclear. Foto: Science History Institute

 

O reconhecimento pelo trabalho de Lise Meitner só veio mais tarde: em 1946 ela foi reconhecida como “Mulher do Ano” nos Estados Unidos, e em 1966 recebeu o prestigioso Prêmio Enrico Fermi da Comissão Atômica dos EUA. Lise Meitner morreu em 1968. Em 1997, suas contribuições foram imortalizadas com a adoção oficial do nome meitnério para o elemento 109 da tabela periódica.

 

Referências

N.N. Greenwood e A. Earnshaw. Chemistry of the Elements. 2ª ed. Buttterworth Heinemann. 1997.

Lise MEITNER. Disponível em https://scientificwomen.net/women/meitner-lise-66. Acesso em 23/05/2023.

Meitnerium. Disponível em https://periodic.lanl.gov/109.shtml. Acesso em 21/05/2025.

Meitnerium. Disponível em https://periodic-table.rsc.org/element/109/meitnerium. Acesso em 21/05/2025.

ATKINS, P. W. Shriver & Atkins química inorgânica. BOOKMAN, 2008.

DINGLE, A. Meitnerium in tribute. Nature Chemistry, [s. l.], v. 9, n. 8, p. 830–830, 2017. Disponível em: https://www.nature.com/articles/nchem.2833.

EMSLEY, J. Nature’s Building Blocks: An AZ Guide to the Elements , Oxford University Press, Nova York, 2ª edição, 2011.

HAYNES, W. M., ed., CRC Handbook of Chemistry and Physics , CRC Press/Taylor and Francis, Boca Raton, FL, 97ª edição, versão da Internet de 2015, acessado em maio de 2025.

HOFFMAN, D. C.; GHIORSO, A.; SEABORG, G. T. Bohrium (107), Hassium (108) and Meitnerium (109). In: THE TRANSURANIUM PEOPLE. [S. l.]: PUBLISHED BY IMPERIAL COLLEGE PRESS AND DISTRIBUTED BY WORLD SCIENTIFIC PUBLISHING CO., 2000. p. 328–340. Disponível em: http://www.worldscientific.com/doi/abs/10.1142/9781860943096_0011.

MERÇON, F.; QUADRAT, S. V. A Radioatividade e a História do Tempo Presente. Química Nova na Escola, [s. l.], v. 19, p. 27–2, 2004.

 

Texto produzido pela jornalista Mari Menda, da Gerência de Relações Institucionais
do CRQ-SP, e revisado pela Profa. Márcia Guekezian, Coordenadora do curso de
Engenharia Química da Faculdade de São Bernardo do Campo – FASB

Compartilhar