A importância do lítio na psiquiatria
A importância do lítio na psiquiatria
O lítio vem sendo utilizado na Medicina há mais de cem anos. Tudo começou com um tratamento de “gota e reumatismo”, em 1859, já que o urato de lítio é o sal mais solúvel do ácido úrico. O lítio foi, algum tempo depois, detectado nas águas de várias estações hidrominerais europeias, o que levou muita gente a atribuir-lhe a eficácia dos tratamentos em spas que possuíam essas águas. Depois disto, o lítio foi utilizado em alguns casos de distúrbios mentais, porém, sem uso clínico sistemático. Há relatos médicos do emprego do brometo de lítio, já em 1873, para o tratamento de doenças agudas do sistema nervoso. Em 1914, o citrato de lítio foi indicado para o tratamento de “gota”, em doses que variavam de 1 a 2 gramas por dia. Nessa época, observou-se que, em doses maiores ( 4 a 8 gramas por dia), o cloreto de lítio poderia provocar fraqueza muscular e distúrbios mentais.
Na década de 30, observou-se que pacientes com hipertensão e problemas cardíacos não deveriam ingerir alimentos com cloreto de sódio, principal componente do sal de cozinha, o que levou os médicos da época a sugerirem o uso de cloreto de lítio. O lítio, que é muito parecido com o sódio, deveria, então, ser misturado com ácido cítrico e pequenas quantidades de iodeto de potássio para substituir o cloreto de sódio na culinária. Depois de vários testes e experiências, a mistura com cloreto de lítio foi liberada para uso geral. Nessa época, alguns efeitos secundários começaram a aparecer em pessoas que utilizavam o lítio em excesso na alimentação ou nos tratamentos. Em 1949, o lítio foi introduzido na prática psiquiátrica e o carbonato de lítio se tornou a mais importante droga da Psiquiatria moderna.
Desde 1975 este medicamento tem sido utilizado na prevenção de várias doenças maníaco-depressivas por cerca de 1% da população do mundo todo. O lítio tem se mostrado muito eficiente no tratamento de casos de depressão, podendo ser utilizado junto com outros antidepressivos.
Alguns distúrbios psíquicos ocorrem com mais frequência em mulheres após a menopausa. Estima-se que cerca de 60% dos pacientes em geral melhoram com o uso do lítio. A dose diária, recomendada pelo médico, depende do sexo, da idade, do peso e da eficiência dos rins do paciente. É comum o uso de 1 a 2 gramas de carbonato de lítio por dia, em várias doses. Em doses elevadas, por outro lado, podem ocorrer efeitos secundários, entre os quais, alergia de pele, arritmia cardíaca, hipotireoidismo e até convulsões.
O tratamento com lítio em geral é longo e deve ser sempre supervisionado e monitorado por especialistas. Um teste com a saliva já indica a quantidade de lítio que circula no fluido cérebro-espinhal, o que evita exames de sangue constantes. Em cerca de 15% dos pacientes tratados com lítio pode se desenvolver o hipotireoidismo, que é controlado com pequenas doses de tiroxina. Alguns trabalhos de pesquisa demonstram que o lítio interfere em processos que dependem de outro metal, o magnésio, presente no sangue humano.
Mesmo com ampla utilização do lítio em Psiquiatria, não há consenso sobre seu mecanismo de ação no corpo humano. Em artigo publicado recentemente, R. Williams e A. Harwood, da University College de Londres, discutem os possíveis mecanismos de ação do lítio no cérebro humano. Entre os mecanismos propostos, dois deles, seriam controlados por enzimas.
Novos experimentos e o desenvolvimento da Biologia Molecular e da genética poderão esclarecer, no futuro, o mecanismo de ação desse notável pequeno íon, o lítio, na terapêutica de doenças psiquiátricas, que podem originar-se de informações transmitidas pelos genes.
Antonio Carlos Massabni
Instituto de Química – Araraquara – UNESP
Publicado em julho de 2006
Atualizado em 25/07/2023