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Acesso em 07/06/2025 às 17h19.

Elemento Químico – Frâncio

Elemento Químico – Frâncio

4 de junho de 2025, às 14h27 - Tempo de leitura aproximado: 7 minutos

Frâncio: radioativo, pesado, raro

 

Um dos primeiros esboços da tabela periódica de Mendeleev exibido em seu apartamento na Universidade de San Petersburgo: lacunas nos elementos não conhecidos na época. Wikimedia Commons

 

O elemento químico frâncio tem símbolo Fr e número atômico 87, pertence ao grupo 1 da tabela periódica, dos metais alcalinos, e tem certas características especiais: possui a eletronegatividade mais baixa dentre todos os elementos conhecidos e é o segundo elemento de ocorrência natural mais rara, logo depois do astato. Além disso, é o mais instável dos 103 primeiros elementos da tabela periódica e possui a maior massa equivalente dentre todos os elementos. O frâncio não apresenta isótopos estáveis, é um metal altamente radioativo que decai e se transforma em astato, rádio e radônio.

Outra de suas principais características é o número de vezes em que pesquisadores de diferentes países anunciaram erroneamente ter descoberto o elemento 87, previsto no final do século 19 por Mendeleev, que deu a ele o nome provisório de eka-caesium. Nomes como Fred Allison, dos Estados Unidos; Jean Perrin, da França e Horia Hulubei, discípulo de Perrin, de origem moldava, não tiveram sucesso em identificar o novo elemento.

Descoberto finalmente em 1939 por Marguerite Perey, no Instituto Curie, em Paris, o frâncio ocorre como resultado de uma desintegração alfa do actínio. Embora ocorra naturalmente em minerais do urânio, estima-se que o planeta abrigue uma quantidade ínfima de frâncio: algo em torno de 30 gramas em toda a crosta terrestre.

 

Diâmetro enorme e apenas um elétron

Imagem de fluorescência de 200.000 átomos de frâncio em uma armadilha magneto-óptica na SUNY Stony Brook. Foto: LUIS A. OROZCO E SUNY STONY BROOK

 

Trinta e três isótopos de frâncio são conhecidos. O isótopo mais estável, 223Fr, tem meia-vida de apenas 22 minutos. É o único isótopo de frâncio que ocorre na natureza, e decai em 223Ra por decaimento beta ou em 219At por decaimento alfa. Os outros isótopos são totalmente sintéticos. Em função das pequenas quantidades produzidas e de sua meia-vida curta, atualmente não há uso para o frâncio fora da área de pesquisa científica. Não se tem notícia de quantidades pesáveis do elemento que já tenham sido produzidas em algum tempo.

O fato de o átomo de frâncio ter o maior diâmetro de qualquer elemento, com enormes 2,7 angström, e ter apenas um elétron na camada externa, fez dele objeto de atenção entre pesquisadores não apenas da química, mas da área da física atômica. Mas com tão pequena quantidade de frâncio na crosta terrestre, os cientistas precisam produzir o elemento para poder estudá-lo. Isto pode ser feito por meio do bombardeamento do tório com prótons ou o bombardeamento do rádio com nêutrons. Em 1997 foi coletada a maior quantidade de qualquer isótopo de frâncio até aquela data: 10.000 átomos de 210Fr sintetizado como um gás ultrafrio na Universidade de Stony Brook, em Nova York. Poucos anos depois, em 2002, na mesma universidade, pesquisadores conseguiram capturar 300.000 átomos de frâncio, nos quais realizaram experimentos importantes.

Como é um metal intensamente radioativo, o frâncio não possui nenhum papel biológico conhecido e é tóxico em função de sua radioatividade. Testes com ratos permitiram concluir que o frâncio se acumula nos rins, fígado e glândulas salivares. Além disso, tentou-se aplicá-lo em medicina nuclear, no diagnóstico de câncer, mas a dificuldade em prepará-lo e isolá-lo tornou o projeto inviável. Essa característica, somada ao seu baixo tempo de meia-vida, fazem com que o frâncio seja um dos poucos elementos sem aplicações práticas.

 

Obtenção

Todos os isótopos de frâncio são extremamente ins­táveis, os de meia-vida mais longa são 212Fr (21 min) e 223Fr (22 min). Esse último, pertencente à série do 235U, é produto da desintegração alfa do isótopo 227Ac. Na natureza há ainda outro isótopo, 224Fr (pertencente à série do 232Th), de meia-vida em torno de 2 min. Ambos os isótopos se desintegram por emissão de partículas beta, convertendo-se respectivamente em 223Ra e 224Ra. Uma diminuta fração (0,005%) de 223Fr desintegra-se por emissão alfa, produzindo 219At. Com base no teor médio de actínio em minerais de urânio (0,15 mg/t), estima-se que neles o teor médio de frâncio seja de 0,38 ng/t.

O frâncio pode ser também produzido mediante bombardeio de ouro (197Au) com 18O em reator nuclear (produz-se o isótopo 212Fr). Outra forma de obter o frâncio é precipitá-lo junto ao césio, através de sais pouco solúveis desses elementos, como o perclorato (ClO4), hexacloroplatinato (PtCl62-), iodato (IO4), entre outros. Contudo, a separação do césio e frâncio é muito difícil, métodos desenvolvidos nas décadas de 1960 e 1970 permitiram a separação de frâncio a partir de soluções com césio e rubídio por meio de resinas trocadoras de cátions. Há também outra técnica empregada com relativo sucesso: a sublimação do cloreto de frâncio (FrCl) em temperaturas da ordem de 300 °C.

De qualquer maneira, a quantidade produzida de frâncio até hoje não foi tão grande e, mesmo que fosse, acabaria muito rápido (já que o frâncio decai, no máximo, a cada 22 minutos). Desta forma, estudos mais aprofundados não foram realizados e as únicas aplicações existentes se encontram no campo das pesquisas científicas.

A Universidade de Nottingham, no Reino Unido, disponibiliza no YouTube dois vídeos com testes e informações sobre o frâncio. Assista:

 

 

Descoberta

 

Marguerite Perey descobriu o frâncio em 1939.

 

Quando Dimitri  Mendeleev elaborou a tabela periódica, em 1869, deixou lacunas para os elementos ainda não descobertos, mas que ele acreditava que deveriam existir. Uma dessas lacunas ficava abaixo do césio, e mais tarde daria lugar ao frâncio.

Em 1914, Stefan Meyer, Viktor F. Hess e Friedrich Adolf Paneth estudavam uma amostra enriquecida de Actínio (227Ac). Eles estavam próximos de uma descoberta real, mas foram interrompidos pela Primeira Guerra Mundial.

Em 1925, o químico russo D. K. Dobroserdov documentou suas descobertas sobre o elemento 87 baseado na detecção de uma baixa radioatividade provinda de uma amostra de potássio.

Mas a descoberta do frâncio foi longa e cheia de reviravoltas. Vários cientistas disseram ter isolado o elemento, sem conseguir. Durante muitos anos essas declarações incorretas foram feitas com base na radioatividade de minerais, ainda inexplicável, ou em novas linhas no espectro de raio-X desses minerais, mas todas finalmente se tornaram inconclusivas sobre a existência do elemento 87.

Em 1929, Marie Curie contratou como assistente de laboratório uma jovem técnica recém-formada, de 20 anos, Marguerite Catherine Perey. Dez anos depois, em 1939, a jovem talentosa descobriu o elemento há muito procurado. Ela purificou uma amostra de actínio (227Ac) livre de todas as impurezas radioativas, e verificou que mesmo assim sua radioatividade, com emissão de partículas beta, ainda indicava a presença de outro elemento. Perey então deduziu corretamente que aquela radioatividade pertencia ao elemento 87. Outros pesquisadores colocaram em dúvida seus resultados, e só depois da Segunda Guerra Mundial, em 1946, a jovem foi oficialmente aceita como descobridora do novo elemento. Ela deu o nome de frâncio ao elemento em homenagem a seu país natal. Dezesseis anos depois de isolar o elemento 87, Perey foi a primeira mulher a ser eleita para a Academia Francesa de Ciências por sua descoberta, uma honra que nem mesmo sua mentora Marie Curie obteve.

 

Referências

Francium. Disponível em https://www.chemeurope.com/en/encyclopedia/Francium.html#google_vignette. Acesso em 19/11/2024.

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Francium. Disponível em https://www.rsc.org/periodic-table/element/87/francium. Acesso em 19/11/2024.

Eric Scerri. Finding francium. Disponível em https://www.nature.com/articles/nchem.430. Acesso em 19/11/2024.

ADLOFF, J.P. e KAUFFMAN, G.B. Francium (Atomic Weight 87), the last discovered natural element. The Chemical Educator, v. 10, n. 5, 2005. Disponível em: http://chemeducator.org/bibs/0010005/1050387gk.htm.

ALONSO, J.C. Elemento Químico Frâncio. Química Nova na Escola. Vol. 39, N° 1, p. 43-44, 2012.

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EMSLEY, J. Nature’s Building Blocks: An AZ Guide to the Elements , Oxford University Press, Nova York, 2ª edição, 2011.

KOPPENOL, W.H. Paneth, IUPAC and the naming of elements. Helvetica Chimica Acta, n. 88, p. 95-99, 2005.

OROZCO, L.A. Francium. Chemical & Engineering News, 2003. Disponível em: http://pubs.acs.org/cen/80th/ francium.html.

 

Texto produzido pela jornalista Mari Elizabeth Menda da Gerência de Relações Institucionais do CRQ-SP e
revisado pela Profa. Márcia Guekezian, Coordenadora do curso de Engenharia Química
da Faculdade de São Bernardo do Campo – FASB

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