Descoberta sobre replicação e reparo de DNA pode ajudar pesquisas sobre câncer
Descoberta sobre replicação e reparo de DNA pode ajudar pesquisas sobre câncer
Testes em laboratório elaborados por pesquisadores do IQ-USP e universidades inglesas abrem perspectivas para o desenvolvimento de novos quimioterápicos22 de setembro de 2023, às 15h57 - Tempo de leitura aproximado: 5 minutos
Pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da USP e de duas universidades da Inglaterra descobriram o mecanismo envolvido na replicação e reparo de DNA que pode auxiliar médicos a tratar e combater diferentes tipos de tumores. Os experimentos, realizados em laboratório, foram capazes de comprovar, pela primeira vez, uma teoria há tempos estabelecida entre os estudiosos da bioquímica molecular. Novos estudos ainda são necessários, mas os cientistas envolvidos acreditam que a descoberta poderá ser utilizada, no futuro, em pesquisas clínicas com novos quimioterápicos para o tratamento de diferentes tipos de câncer e outras doenças.
Imagem: Madeleine Price Ball/Wikimedia Commons/Domínio Público
Já era conhecido que os danos ao DNA poderiam ocorrer antes e/ou após a forquilha de replicação — afinal, em uma situação natural, as modificações moleculares são aleatórias. Porém, nenhum pesquisador havia conseguido separar os dois processos, a fim de compreender qual deles é mais comprometedor para a viabilidade celular — ou seja, qual local de dano interrompe a replicação ou leva a célula à morte.
Neste contexto, Nícolas Hoch e seus colaboradores propuseram dois experimentos: no primeiro, foi adicionado a uma cultura de células em replicação um composto chamado de clorodeoxiuridina (CldU) — um análogo de nucleotídeo modificado, que é incorporado somente à fita recém-sintetizada de DNA. No exemplo anterior, é como se você usasse uma caneta de cor diferente para escrever as letrinhas da nova receita no papel. O CldU é reconhecido pela célula como um dano molecular, o que ativa os mecanismos de reparo de DNA. Para identificar quais os efeitos desse dano imediatamente após a replicação, os pesquisadores trataram as células simultaneamente com um outro composto, chamado inibidor de PARP — cuja função é impedir a via de reparo de DNA que corrige o dano específico provocado pelo CldU. Nesta situação, observou-se que as células não morreram e conseguiram se multiplicar sem grandes problemas.
No segundo experimento, os pesquisadores utilizaram como base a mesma condição anterior — em que as células passaram por uma fase de replicação na presença de CldU e, portanto, o dano já está inserido no DNA. Quando as células começaram uma nova rodada de replicação, foi adicionado à cultura o inibidor de PARP, a fim de impedir o reparo do DNA danificado nas fitas-molde — ou seja, o material genético usado como base para a cópia, à frente da forquilha de replicação. Na analogia anterior, seria como utilizar a receita feita com cor diferente para produzir um novo transcrito. Ao final do ensaio, observou-se que a presença dos danos não reparados provocou o colapso da forquilha, a interrupção da replicação e até mesmo a morte celular.
Com os resultados dos experimentos, pode-se chegar a duas conclusões principais: primeiro, de que os danos ao DNA molde, à frente da forquilha de replicação, são os que realmente comprometem a integridade e a viabilidade celular. Segundo, de que se o inibidor de PARP — um quimioterápico já adotado na clínica para tratar alguns tipos de câncer — for utilizado em combinação com o CldU, ele pode ter o seu efeito potencializado contra os tumores. Mais pesquisas, no entanto, são necessárias para comprovar esta hipótese.
Os dados estão no artigo Unrepaired base excision repair intermediates in template DNA strands trigger replication fork collapse and PARP inhibitor sensitivity, publicado na revista científica The EMBO Journal.
Mais informações: e-mail nicolas@iq.usp.br, com o professor Nícolas Carlos Hoch.
Trabalho veiculado pelo Jornal da USP, com base em texto produzido pela Assessoria de Comunicação do Instituto
de Química, editado por Valéria Dias , estagiária supervisionada por Moisés Dorado.